segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Tzvetan Todorov: Os inimigos íntimos da democracia


Segundo Tzvetan Todorov, em 2003, a invasão do Iraque pelas forças armadas norte-americanas e a consequente deposição do regime de Saddam Hussein foram baseadas num jogo de mentiras e meias verdades que estarreceu o mundo. As armas de destruição em massa supostamente à disposição do Exército iraquiano jamais foram encontradas, e desde então tem sido quase impossível justificar essa intervenção militar sem admitir que os interesses da indústria do petróleo sempre estiveram por trás do discurso pró-democracia evocado pela coalizão ocidental. Do mesmo modo, em nome de valores universalmente reconhecidos como autodeterminação dos povos e direitos humanos, os bombardeios da OTAN que se seguiram à revolução popular na Líbia reeditam os piores episódios do imperialismo europeu no século XIX.

Para o autor, esses são apenas alguns dos exemplos que podem evidenciar o que ele chama de 'a assustadora corrosão da democracia no mundo contemporâneo'. Ele defende que a cidadania encontra-se cada vez mais ameaçada pela combinação entre o cinismo dos políticos tradicionais, indiferentes aos verdadeiros anseios da sociedade, e a ascensão de movimentos populistas à direita e à esquerda. Todorov intervém no debate público sobre a sobrevivência da democracia no século XXI, emitindo um alerta sobre a sorrateira supressão das liberdades engendrada por governos, mídias e corporações.

Nas palavras de Todorov: “As democracias também se valem de certa concepção da ação política. Também nesse aspecto, tentam evitar dois extremos. Por um lado, a diferença das teocracias e dos regimes totalitários, elas não prometem à sua população a salvação, nem lhe impõem o caminho a seguir para alcançá-la A construção do paraíso na Terra não faz parte do seu programa; a imperfeição de toda ordem social é considerada como um dado prévio. Mas, por outro lado, as democracias tampouco se confundem com os regimes tradicionalistas e conservadores nos quais se pensa que nenhuma regra imposta pela tradição deve jamais ser questionada. Elas recusam as atitudes fatalistas de resignação. Essa posição intermediária autoriza interpretações divergentes, mas pode-se dizer que toda democracia implica a ideia de um melhoramento possível da ordem social, de um aperfeiçoamento graças aos esforços da vontade coletiva. Hoje em dia o termo “progresso” é mantido sob suspeita, mas a ideia que ele recobre é inerente ao projeto democrático. E o resultado aí está: os habitantes dos países democráticos, embora freqüentemente se mostrem insatisfeitos com sua condição, vivem num mundo mais justo do que aquele dos habitantes dos outros países. Eles são protegidos pelas leis; gozam da solidariedade entre membros da sociedade que beneficia os idosos, os doentes, os desempregados, os miseráveis, podem invocar os princípios de igualdade e de liberdade, e até um espírito de fraternidade.”

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