segunda-feira, 29 de junho de 2015

El desafío griego

Editorial
La Jornada

El Congreso griego aprobó el sábado, por amplia mayoría, el proyecto de referendo propuesto por el primer ministro Alexis Tsipras para que los ciudadanos de la nación mediterránea decidan el próximo 5 de julio si aceptan la última oferta realizada por los acreedores de ese país –la Unión Europea y el Fondo Monetario Internacional–, la cual consiste en extender por cinco meses su programa de rescate, con un financiamiento de al menos 12 mil millones de euros, a cambio de un programa de ajustes fiscales y más reformas de cuño neoliberal. Al exponer la iniciativa, Tsipras instó a sus conciudadanos a que digan "un gran NO al ultimátum" de los acreedores.

El precedente ineludible de esta convocatoria a definir el rumbo de Grecia –y de Europa, en buena medida– mediante el voto popular, es la falta de acuerdo entre el gobierno de Atenas y la troika europea para buscar una salida a la difícil situación económica del país helénico: a pesar de que Atenas puso sobre la mesa la posibilidad de realizar ajustes adicionales que no implicaran un sacrificio mayúsculo de su población, los poderes que dominan de hecho la definición de la política económica en naciones europeas occidentales mantuvieron una postura irreductible y sostuvieron que no sería aceptable ninguna fórmula que se alejara de la preceptiva neoliberal, que consiste precisamente en procurar la salud de los indicadores macroeconómicos aun a costa del sufrimiento de las mayorías.

En ese sentido, mientras que algunos medios internacionales al servicio de los intereses financieros acreedores afirman que la postura del gobierno heleno implica abortar la posibilidad de una solución negociada entre Grecia y sus acreedores, la realidad es que han sido éstos los que han colocado a Atenas ante la perspectiva indeseable de asumir el desgarrador costo social de permanecer en la zona euro o enfrentar la perspectiva de salir de ella.

El gobierno griego, por su parte, no ha hecho sino refrendar el sentido del mandato popular que colocó en el poder a una coalición de izquierdas como Syriza: el rechazo a la mansedumbre que mostraron en su momento los gobiernos de Nueva Democracia y el Partido Socialista Panhelénico (Pasok) frente a la política económica dictada desde Bruselas.

Esa misma vocación democrática se expresará ahora con la consulta sobre la aceptación o no de las condiciones impuestas por la troika europea. En caso de que la mayoría de los griegos se incline por el no, Grecia podría enviar al mundo un mensaje de autodeterminación que más temprano que tarde cundiría entre las sociedades de otras naciones europeas con problemas de endeudamiento.

Al día de hoy están a la vista el dramático y brusco descenso de los niveles de vida, la furia social y la inestabilidad política que producen las recetas emanadas de Bruselas y Washington. Cabe preguntarse si los griegos transigirán ante las campañas internacionales de linchamiento contra su gobierno o si harán valer una soberanía nacional que por ahora se mantiene en un plano meramente teórico y de obligada supeditación a los designios de entidades financieras trasnacionales, acreedores privados y gobiernos de países poderosos.

domingo, 28 de junho de 2015

Devo, não nego. E não vou pagar

Lee Siegel
Estadão

Escrevi um artigo contando que dar o calote nos empréstimos que me permitiram cursar a universidade era minha única chance de viver. Atingi o nervo exposto da oculta tensão de classe nos Estados Unidos.

Há três semanas, escrevi um artigo de opinião para o New York Times no qual descrevi ter chegado a um ponto, quando jovem, em que meus pagamentos do empréstimo estudantil tinham se tornado tão esmagadores, tão proibitivos, que eu decidi que a única maneira em que poderia viver era deixando de pagar esses empréstimos. O artigo se tornou viral. A coisa virou um loucura.

Fui chamado de caloteiro. Fui caracterizado como “um crítico premiado e sanguessuga impenitente”. Algumas pessoas ligaram para o governo vir tirar a casa de minha família. Outras imploraram para as autoridades me enfiarem na cadeia. Um homem telefonou para minha casa e, quando minha mulher atendeu, ameaçou para ela.

Fui retratado como um libertino e um parasita egoísta na sociedade. Houve um lado positivo em tudo isso, também. Para me fazer parecer alguém que havia prosperado às custas do contribuinte americano, meu status foi inflado e distorcido. No auge do furor, eu estava sendo descrito em alguns quadrantes como uma mulher de 62 anos que havia sido indicada para o Prêmio Pulitzer e vivia numa mansão de US$ 2 milhões nos arredores de Nova York. (Aparentemente alguém havia consultado a página da Wikipédia de outro escritor chamado Lee Siegel, que, aliás nunca foi indicado ao Pulitzer, mas parece ter tido a previdência de dizer que fora em seu verbete).

Nenhuma parte dessa caracterização de mim era verdadeira. Tenho 57 anos e, depois de Bruce Jenner (o ex-atleta olímpico transexual que pediu para ser chamado de Caitlyin), posso perfeitamente vir a ser uma mulher daqui a cinco anos, quem sabe? Mas essas imprecisões não foram nada em comparação com a maneira como meu artigo foi deliberadamente mal interpretado.

Fui levado a escrever o artigo pelo simples fato de que, nos Estados Unidos, a universidade não é gratuita. Isso significa que jovens pobres com talento, inteligência e motivação não podem ir à universidade de sua escolha, mas que jovens ricos, com menos dotes, podem ir a qualquer lugar que lhes agrade. Meu artigo era sobre a trágica predestinação de classe nos Estados Unidos. Era também sobre a desigualdade de punição, sobre como a evasão fiscal permanece impune, mas dar o calote num empréstimo estudantil pode arruinar a vida de uma pessoa. Os empréstimos estudantis são os únicos que não podem ser quitados por falência. Por sua vez, Donald Trump, que afirma ter ganhado mais de US$ 2 bilhões, declarou falência corporativa quatro vezes.

As taxas de suicídios de jovens americanos estão mais altas do que nunca. Os níveis de estresse, ansiedade e depressão são maiores entre os jovens do que têm sido desde a Guerra do Vietnã. Parte da razão para isso é o montante de dívida com que os jovens se diplomam - em média US$ 30 mil. Com os juros (minha taxa de juros é de 9%), eles acabam tendo de pagar sua dívida estudantil pelo resto de suas vidas. Isso toma quase impossível muitas pessoas começarem uma família, comprarem uma casa, e mesmo comparem um carro.

Dei uma olhada nesta situação e, num ano em que as campanhas presidenciais estão começando a esquentar, pensei que poderia tentar pôr a questão da dívida estudantil no primeiro plano da consciência das pessoas. Também queria tranquilizar os milhões de jovens que, ou estão inadimplentes, ou estão tremendo de pavor à beira do calote. Perto do fim de meu artigo, num breve parágrafo, ofereci algumas dicas sobre como sobreviver após o calote. As agências de cobrança contratadas pelo governo para ir atrás de estudantes devedores com frequência aterrorizam as pessoas mentindo sobre as consequências do calote. Elas deixam os jovens, em especial jovens deixados vulneráveis por suas origens modestas, humilhados, assustados e envergonhados demais para questionar a veracidade das ameaças. Eu quis dar esperança a essas pessoas.

Sabia que, dada a conexão absurda entre moralidade e dívida, ia enfrentar uma tempestade de ofensas. Mas não esperava um furacão. Pessoas me acusaram de ludibriar o sistema para meu benefício, quando eu pensava ter deixado claro que sofri durante anos após ter ficado inadimplente. Pessoas também usaram o fato de eu ter três diplomas de Columbia para implicar que eu era de certo modo frívolo e autoindulgente com o dinheiro emprestado que havia recebido. Tive de ir à televisão para explicar que eram três diplomas, não três Audis, e que três diplomas são necessários para se tornar um professor universitário, que era o que eu pretendia me tornar antes de me decidir a ser um escritor.

No artigo, expliquei que havia começado numa pequena faculdade privada e que havia saído depois que a falência de meu pai e o divórcio de meus pais tornaram impossível eles arcarem com o custo dessa escola, mesmo com meus empréstimos. Falei de querer uma educação melhor do que as que estava recebendo na universidade estadual - diferentemente do Brasil, onde a educação pública superior é soberba, muitas faculdades e universidades estaduais nos EUA são medíocres - e de largar o estudo para vender sapatos em tempo integral.

A reação me surpreendeu. Disseram-me que, na América democrática, eu devia ter ficado onde estava. Que não devia ter olhado além de minhas origens de baixa classe média. Que devia ter ficado vendendo sapatos e que estava sendo desrespeitoso com as pessoas que vendiam sapatos para viver. E todas essas críticas estavam vindo de jornalistas que vieram de origens privilegiadas e nunca haviam trabalhado em nada remotamente parecido com uma loja de sapatos em todas suas vidas! Eu lhes assegurei, em outra entrevista na televisão, que nenhum vendedor de sapatos deixaria passar uma oportunidade de melhorar sua ocupação.

A resposta mais virulenta foi me chamarem de “criminalmente negligente” por recomendar o calote para as pessoas. As consequências do calote, gritaram meus críticos, eram tétricas. Salários confiscados! Cheques da previdência social confiscados! Crédito arruinado para sempre! Ativos sequestrados! Ações judiciais! De novo, tive de explicar na televisão que não havia escrito uma coluna de consultoria financeira; havia apelado para um ato de desobediência civil para tentar mudar um sistema injusto que estava relegando ao esquecimento social incontáveis jovens talentosos e inteligentes.

O que eu não tive tempo de dizer foi que, de fato, as chamadas consequências tétricas que os críticos estavam descrevendo eram, em sua maioria, conversa para assustar. Eram as mesmíssimas ameaças usadas pelas agências de cobrança - quatro das quais foram recentemente descontratadas pelo Departamento de Educação por mentirem a alunos inadimplentes. A verdade é que, de 7 milhões de estudantes inadimplentes, somente 175 mil estavam tendo seus salários confiscados. Somente 33 mil estavam tendo seus cheques da previdência social confiscados. Os julgamentos de calotes acontecem sete anos após a produção de um relatório a respeito. O Departamento de Educação não tem o poder de sequestrar ativos. E eles quase nunca processam alguém. Uma ação judicial é muito cara. Mas não tive a oportunidade de dizer nada disso. O clamor estava alto demais.

O ponto central de meu artigo foi que o que é legal nem sempre é moral. No meu entender, a educação, como a assistência à saúde, deve ser um direito básico. A mobilidade social - escrevi - é a chave da liberdade americana, e a chave da mobilidade social é a educação.

No dia seguinte à publicação do meu artigo, o Departamento de Educação perdoou bilhões de dólares de empréstimos inadimplentes tomados por estudantes que haviam frequentado universidades com fins lucrativos que os haviam enganado. O caso estivera pendente durante meses. Vários dias depois do artigo, Hilary Clinton e os senadores democratas Elizabeth Warren e Bernie Sanders, que haviam colocado links para o meu artigo em seus sites, fizeram declarações enfáticas sobre a necessidade de a educação ser gratuita ou financeiramente acessível.

Tudo isso poderia não ter acontecido se eu ainda estivesse vendendo sapatos. Quanto a mim, preciso tentar capitalizar minha coluna e ver se consigo meu próprio programa na TV cabo intitulado “A Hora do Caloteiro com Lee Siegel”. Eu daria conselhos sobre como não pagar a babá, como se livrar da mesada dos filhos, coisas assim.

Enquanto isso não acontece, tenho de usar óculos escuros quando saio. Não estou brincando. Atingir o nervo exposto da tensão de classe oculta neste país não é brincadeira. E, no mais, estou ficando preocupado. O dinheiro do empréstimo estudantil está começando a acabar.

sexta-feira, 12 de junho de 2015

Grecia, acorralada por los países ricos

Roberto Savio
IPS

Cincuenta años de Guerra Fría y el hecho que la canciller Angela Merkel creció en la entonces Alemania Oriental, posiblemente pueden explicar el curioso influjo político que Estados Unidos ejerce sobre Europa. Después de una reunión bilateral entre Merkel y el presidente estadounidense, Barack Obama, durante la cumbre del Grupo de los Siete (G-7) países más ricos, en la localidad alemana de Elmau, el 7 y el 8 de este mes, se supo que hubo una solución de compromiso.

La mandataria alemana aceptó que la Unión Europea (UE) continúe aplicando sanciones a Rusia, lo que indujo a los demás países a seguirla. En cambio, Obama modificó la posición de Washington respecto a la ayuda económica a Grecia. Esa postura había sido expresada de manera inequívoca unos días antes a los líderes europeos por el secretario del Tesoro estadounidense, Jack Lew, quien sostuvo que es necesario resolver el problema griego para evitar un impacto global que no nos podemos permitir. Esta posición aceleró repentinamente las negociaciones, con la esperanza que todo se resolvería antes de la cumbre del G-7.

Pero Grecia no aceptó el plan que le presentó el presidente de la Comisión Europea, Jean-Claude Juncker, porque era sospechosamente cercano a las posiciones de Fondo Monetario Internacional (FMI) a favor de más recortes presupuestarios y más austeridad. En la cumbre, Obama endureció la posición de Estados Unidos respecto a Grecia, e incluso dijo que “Atenas debe ejecutar las reformas necesarias”.

El tira y afloja entre Grecia y sus socios europeos se prolonga desde hace cinco años. La crisis griega se produjo por los gastos excesivos de los gobiernos precedentes al actual gobierno de Alexis Tsipras, que incurrieron en el aumento en gran escala del empleo público y en un sistema de pensiones extremadamente costoso. En 2009, el Movimiento Socialista Panhelénico (Pasok) ganó las elecciones y se descubrió que las cifras que Atenas había estado enviando a Bruselas eran falsas.

El déficit anual real era varias veces superior al declarado, de casi 12,5 por ciento del producto interno bruto (PIB). Se trató de una confirmación de lo que la UE y sus organismos sospecharon por largo tiempo, pese a lo cual nada se había hecho. Sin entrar en detalles sobre las angustiantes negociaciones anteriores entre Grecia y la UE, se llega a las elecciones de enero de este año, que gana el partido progresista de Tsipras, Syriza. Su programa era claro: detener el plan de austeridad de la Troika -FMI, UE y el Banco Central Europeo- impuesto en nombre de los países europeos liderados por Alemania, Holanda, Austria y Finlandia.

Grecia está de rodillas. Oficialmente, el desempleo ha pasado de 11,9 por ciento en 2010 a 25,5 por ciento en la actualidad, pero se coincide que en realidad se sitúa en alrededor de 30 por ciento. Entre los jóvenes, la desocupación está llegando a 60 por ciento. El PIB ha descendido 25 por ciento, los ciudadanos griegos han perdido alrededor de 30 por ciento de sus ingresos y el gasto público se ha reducido de tal manera que los hospitales tienen grandes dificultades de funcionamiento. Empero, la exigencia de la Troika es simple: corten y sigan cortando hasta la eliminación del déficit. Por ejemplo, las pensiones ya han sufrido dos recortes y se pide una nueva reducción. Con esto se obtendrían apenas unos 100 millones de euro, causando un enorme daño a los pensionistas que viven con 685 euros por mes, o aún menos.

Cuando Juncker asumió la Presidencia de la Comisión Europea, el órgano ejecutivo de la UE, anunció un grandioso Plan Marshall para Europa. Tras la proclama, el proyecto desapareció totalmente de la escena. La austeridad es la brecha que divide las opciones de Estados Unidos y de la UE. Estados Unidos ha emprendido el camino de la inversión para el crecimiento -a pesar de la presión del opositor Partido Republicano a favor de la austeridad-, y la economía está creciendo de nuevo. En cambio la UE es dirigida por Alemania y los alemanes están convencidos de que lo que hicieron en su país es universalmente válido.

Existe un consenso generalizado de que la crisis de Grecia, que representa solo dos por ciento del PIB de la UE, podría haber sido solucionada cuando comenzó, con un préstamo de entre 50.000 y 60.000 millones de euros (56.600 y 67.800 millones de dólares). Pero desde que Tsipras se convirtió en primer ministro y con el respaldo del apoyo popular comenzó a negarse a aceptar en bloque el plan de los acreedores, Grecia se ha convertido en un tema de gran importancia. Ahora se habla de una “Grexit”, o salida de Grecia del euro y de la UE. Esto tendría un efecto cascada y supondría el fin del sueño común de una Europa basada en la solidaridad y el sentido de comunidad.

En el G-7, Obama insistió en las inversiones y el estímulo a la demanda como una manera de salir de la crisis. Merkel reiteró una vez más que Europa no necesita de estímulos financiados por el endeudamiento sino de incentivos procedentes de la reforma de las economías ineficientes. Este espectáculo me recuerda una frase del prestigioso periodista de Sri Lanka Tarzie Vittachi: “todo es siempre sobre otra cosa”.

Es interesante observar que una de las razones que se aducen para ser tan duros con Syriza es que los ciudadanos de España, Portugal e Irlanda, los primeros que tragaron la amarga píldora de la austeridad, se indignarían si se opta por un camino diferente para Grecia. Se da la casualidad que esos tres países tienen gobiernos conservadores. Todo el sistema político europeo se estremeció cuando Syriza ganó las elecciones, y nuevamente hace algunos días con la victoria de Podemos, el partido de izquierda y adverso a la austeridad en las elecciones municipales en España.

Por alguna razón, el gobierno extremamente autoritario y conservador húngaro de Viktor Orbán, la reciente victoria del muy conservador Andrzej Duda como presidente de Polonia, así como el ascenso en Italia de Matteo Salvini, de la antieuropeísta y xenófoba Liga Norte, no logran crear pánico. Esto es porque en la actualidades es en Grecia donde acecha el verdadero adversario del “statu quo”. Se trata de castigar a una figura antisistema como Tsipras y demostrar que la izquierda radical no puede dirigir un país europeo. Pero ¿alguien realmente cree que masas de ciudadanos en Madrid, Lisboa o Dublín se tomarían las calles para protestar si Europa hiciera un salto mortal de solidaridad e idealismo y decidiera atenuar sus dacronianas exigencias a Grecia?

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Afinal, o que é o precariado?

José Soeiro
Expresso

O que terão em comum os distribuidores de pizza que ganham 1 euro e 17 cêntimos por cada entrega e que se mobilizaram recentemente contra a redução desse valor para metade (e ganharam!), os voluntários que esta semana começaram a trabalhar à borla na feira do livro, os trabalhadores de call center que, há alguns meses, fundaram um novo sindicato e os estagiários do IEFP que se organizaram recentemente numa assembleia para combater os abusos? Serão eles o “precariado” emergente?

No final da década de 1990, o sociólogo francês Robert Castel utilizava pela primeira vez este conceito. Observando as mutações na produção, a multiplicação de estatutos entre emprego e não-emprego e a expansão de formas “atípicas” de trabalho, Castel constatava a emergência de uma “condição precária entendida como um registo próprio dentro dos trabalhadores assalariados”. Essa precariedade deixava de ser excecional ou provisória e surgia, para um grupo cada vez maior de pessoas, como um estado permanente. Castel chamou a esse estado de “precariado”. Uns anos mais tarde, um economista inglês, Guy Standing, escreveu um livro polémico (publicado no final do ano passado em Portugal), chamado “O Precariado: A Nova Classe Perigosa”. A sua tese é clara: estamos perante a emergência de uma nova classe, definida pela insegurança laboral, pela dependência do salário direto e pela ausência de uma “identidade baseada no trabalho”, que precisaria de encontrar a sua agenda política e formas próprias de representação.

No início dos anos 2000, primeiro em Milão e depois por toda a Europa, surgia um movimento que dava expressão autónoma a estes trabalhadores. Juntando precários e migrantes, o MayDay era uma manifestação peculiar, com uma estética visual pop que a aproximava mais das Love Parades do que dos tradicionais desfiles sindicais. Em apenas dois anos, a parada dos precários ultrapassava, em dimensão, os desfiles organizados pelas centrais sindicais italianas.

Nos últimos anos, muitos observadores olham para o precariado como o grande protagonista das mobilizações sociais que percorreram o planeta desde o final de 2010. Também por isso, têm chamado a esses protestos “a rebelião do precariado”. Nas recentes eleições espanholas, o terramoto provocado pelos indignados e a mobilização política e eleitoral do “precariado” são dois dos fatores que têm sido utilizados para explicar os resultados do Podemos e das alianças da esquerda alternativa.

Mas fará sentido falar em “precariado”? Será o seu crescimento uma tendência incontornável da economia? Trata-se de uma nova classe? E residirá no precariado a chave para as transformações políticas do futuro?

Mais do que uma classe à parte, o precariado é uma parte da classe trabalhadora. Qual? A que está mais exposta às mutações do mundo do trabalho e à sua desregulação. Também por isso, está mais distante das formas clássicas de representação e organização, como os sindicatos e os partidos. Com vínculos instáveis, empregos periféricos no sector informal da economia, trabalho não declarado, as atividades do precariado exercem-se à margem da proteção social e, muitas vezes, da própria cobertura legal. E a experiência subjetiva do precariado extravasa o domínio laboral. Constitui-se, para alguns, como um modo de vida marcado pela insegurança e pela imprevisibilidade relativamente ao futuro.

No precariado que se tem mobilizado encontram-se os vestígios de uma classe operária afetada pela subcontratação da mão-de-obra, pelo aumento do desemprego e pela precarização dos vínculos (em Portugal, se somarmos os trabalhadores da indústria e da construção, temos 20% da força de trabalho, segundo dados do Banco de Portugal de maio deste ano). Mas encontra-se também grande parte dos trabalhadores “imateriais” e do “conhecimento”, da chamada “classe média” (conceito problemático) vítima da precarização, da austeridade e do empobrecimento. E ainda o novo “proletariado dos serviços” – da caixa do supermercado ao call center –, que partilha os salários baixos, a instabilidade profissional, as tarefas rotineiras, os horários longos e instáveis. A esses, devem somar-se os 70 mil estagiários, os cerca de 50 mil contratos emprego inserção, os bolseiros e o falso voluntariado. Se lhes acrescentarmos os desempregados, temos bem mais de metade da classe trabalhadora do país.

O precariado tem tido voz? Alguma, mas menos do que a que devia. Por um lado porque a precariedade do trabalho inibe a própria organização. Segundo, porque uma parte dos seus segmentos mais ativos emigraram nos últimos anos. O precariado falará neste novo ciclo político? Veremos. Mas o que é certo é que não há nenhuma solução para o país que não passe por ele.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Italia: La primera derrota de Matteo Renzi

Giaime Pala
Mientras tanto

El domingo se celebraron en Italia elecciones para elegir a los presidentes de siete regiones (Toscana, Liguria, Marche, Umbria, Campania y Veneto) y a los alcaldes de 742 ayuntamientos (17 de los cuales, capitales de provincias). Se trataba de un examen importante para Matteo Renzi, presidente del gobierno desde febrero de 2014 y tercer primer ministro no elegido por los ciudadanos desde la caída de Silvio Berlusconi en noviembre de 2011. El Partido Democrático (PD) ha ganado en cinco de las siete regiones y en la mayoría de los 742 ayuntamientos. Sin embargo, estas elecciones representan una primera derrota política para el ex-alcalde de Florencia. Por de pronto porque el PD pierde hasta el 20% de los votos que cosechó en esas mismas regiones y ciudades con ocasión de las elecciones europeas de 2014, además del gobierno de una región históricamente escorada a la izquierda como Liguria. Y en segundo lugar, porque la oposición a su gobierno −que parecía en declive y/o sustancialmente inocua− o bien mantiene posiciones, como el Movimiento 5 Estrellas de Beppe Grillo, o bien vuelve a ser competitiva allá donde la derecha (es decir, Forza Italia y la Liga Norte) se presenta unida. Si el PD ha vuelto a ganar es gracias sobre todo a una abstención enorme (48%), que va camino de volverse crónica y que le beneficia por tener a un núcleo de electores cuya fidelidad de voto aún es elevada.

Con todo, pocas dudas pueden caber acerca de que el primer ministro italiano aspirase a obtener una victoria mucho más contundente que le reforzara después de la aprobación de una nueva ley electoral ultramayoritaria y de una reforma laboral −parecida a la que aprobó en España el gobierno de Mariano Rajoy en 2012− presentada como la panacea para solucionar el problema del paro (que ya roza el 13%). El mismo Renzi presentó implícitamente estas elecciones como una especie de test sobre su acción de gobierno. De modo que los resultados del domingo nos revelan algunos puntos interesantes: que su liderazgo pierde eficacia y que su manera de gobernar empieza a ser vista como arrogante y peligrosamente personalista; que su política económica neoliberal y atenta a respetar todos los insostenibles tratados de la UE, le está enajenando el favor del electorado de izquierdas; y que su gobierno ya no parece tan brillante como antes a la hora de ganar consenso en el electorado de derecha. En suma, su propuesta política muestra ya las primeras grietas pese a contar con el apoyo incondicional de los grandes medios de comunicación, de las organizaciones empresariales y, sobre todo, de Bruselas y Berlín.

Aún es pronto para saber cómo va a evolucionar el panorama político tras las elecciones de domingo. Pero cuesta creer que el ingenuo populismo de Grillo o la xenófoba Liga Norte puedan representar un serio desafío para un PD avalado por la UE y los poderes fácticos italianos. En realidad, su control del país es y será sólido mientras no tenga una alternativa política a su izquierda. Porque, reconozcámoslo, en Italia la izquierda transformadora sigue sumida en la irrelevancia a causa de la lógica electoralista que ha caracterizado la práctica de sus dirigentes. Una práctica que, al menos desde la desastrosa derrota electoral de 2008, ha priorizado el volver al Parlamento y a las instituciones en detrimento de la movilización social y el trabajo capilar en los territorios. Un ejemplo palmario de ello lo encontramos en el naufragio del proyecto “Un’Altra Europa con Tsipras”, una plataforma electoral que el año pasado agrupó a un conjunto de partidos y movimientos alternativos y que se proponía implantar una suerte de franquicia italiana de Syriza (como si el éxito político fuera el fruto de una marca mediáticamente potente y no el resultado de un movimiento real construido desde abajo).

Se trata de la misma lógica que lleva ahora a no pocas personas a pedir un “Podemos italiano” y que esconde un grave problema de fondo: la escasa voluntad de iniciar un lento, desagradecido pero eficaz proceso de reconstrucción político-cultural del que la izquierda italiana anda necesitada. Más claro todavía: su declive se inició (o se acentuó) cuando olvidó el consejo metodológico que le legó su más preciado teórico del siglo XX: el de estudiar en serio los problemas económicos y sociales del país y ofrecer respuestas y estructuras adherentes a la realidad de las clases trabajadoras. En definitiva, cuando renunció a su carácter nacional-popular en nombre de un europeísmo tan abstracto como falsamente internacionalista. Para la izquierda italiana, pues, ha llegado la hora de cambiar categorías interpretativas y métodos de lucha.

terça-feira, 2 de junho de 2015

Espanha é um país diferente depois das eleições

Esther Solano Gallego
Carta Capital

O sismo eleitoral é a resposta explícita de um país que não suportava mais sua política. Não foi só a crise financeira, mesmo que tortuosa. Foi a indecência dos representantes políticos o que provocou uma ferida intolerável, uma vontade social de explodir no voto.

Raiva pelos inúmeros escândalos de corrupção que impediram qualquer dignidade institucional. Mágoa com as velhas estruturas partidárias que demostraram ser monstros insensíveis, discursando para suas plateias de bufões, batendo palmas entre eles numa pantomima continua de louvores mútuos, alheios a uma cidadania cada vez mais irritada. E, cuidado, porque quando uma população cansada, exausta do mesmo desrespeito, leva seu desprezo pelo velho e sua necessidade do novo às urnas, muitas coisas podem mudar, e mudaram.

O modelo bipartidarista, que sempre repartiu as rédeas do poder ente duas máquinas esgotadas e caducas, Partido Popular (PP) e o Partido Socialista (PSOE), entrou em declínio imparável. Só 52% dos eleitores votaram em algum dos dois partidos, num país acostumado à inercia de uma bipolaridade apática.

O Partido Popular que arrebatou de forma drástica as eleições ao PSOE em 2011, numa Espanha apavorada em plena convulsão da crise financeira, perdeu sua hegemonia, com a que governava quase em solitário desde as cadeiras do Congresso. Continua sendo a força mais votada, mas diminuiu em 2.444.103 milhões de votos respeito a 2011 e perdeu suas maiorias absolutas inclusive em feudos tradicionais como Valência o Madri.

Se alguém pode se declarar veementemente vencedor, são as candidaturas cidadãs de unidade popular que integra Podemos, Barcelona em Comú e Ahora Madrid. Tudo indica que a ativista antidespejo Ada Colau será a nova prefeita de Barcelona, assim com a juíza aposentada Manuela Carmena próxima prefeita de Madri. Pensem na transmutação, na metamorfose da ordem política que isso supõe. As duas maiores cidades espanholas governadas por movimentos cidadãos, derivados do 15M e institucionalizados em menos de um ano.

E agora? As eleições foram a primeira etapa superada num processo incerto, mas a governabilidade ainda não está dada. A atomização da maioria de parlamentos regionais e prefeituras leva a Espanha à situação de refletir sobre pactos insólitos com atores emergentes, tendendo a um debate mais plural e com propostas menos rígidas. As cabeças pensantes dos partidos já estão ponderando estratégias de ação tendo em vista que as eleições nacionais de novembro, que prometem nos levar ao enfarte agudo do miocárdio coletivo, repetirão o mesmo padrão das atuais.

A possibilidade mais natural, se em política a linha reta alguma vez fosse o caminho mais curto unindo dois pontos, seria que as plataformas cidadãs pactuassem com o PSOE, com maiores semelhanças ideológicas, assegurando assim as prefeituras de Barcelona, Madri e outras cidades menores. Mas, cautela, porque os socialistas correm o risco de serem mastigados abruptamente, engolidos pelo tsunami de Podemos e acabar relegados à terceira força política nacional. Isto deixa outra alternativa, surrealista por natureza, mas já anunciada por algumas lideranças: um pacto entre PSOE e PP, um antagonismo partidário que sempre pareceu irreconciliável, para anular Podemos.

Uma vez decidido o tabuleiro das coalizões e imaginando que Barcelona em Comú e Ahora Madrid chegassem efetivamente ao poder, quais seriam as reais capacidades de instaurar uma agenda de esquerda nos municípios? O programa de Colau e Carmena inclui lutar contra a pobreza urbana e a desnutrição infantil, evitar os cortes de agua, luz e eletricidade dos mais afetados pela crise, parar os despejos, estabelecer uma fiscalização maior nas contas públicas, utilizar imóveis vazios para famílias com poucos recursos financeiros, revisar privatizações e contratos... Possível? Impossível? Uma empreitada que não será fácil.

O momento é de otimismo, mas também de precaução. A população conseguiu canalizar sua indignação pela via do voto. Espanha precisava de uma sacudida, um estremecimento, para manter sua saúde democrática. O novo traz expectação, perspectivas, anseios. Oxigena. Por outro lado governar não é um assunto banal, sobre tudo para atores principiantes, e ainda estamos no começo da caminhada. Espanha mudou e toda mudança conduz a incertezas, mas prefiro estas incertezas a uma estabilidade perversa e artificial.